Justiça, mostra a tua cara

Há pouco a mídia de Mato Grosso exibiu uma patética reportagem, dessas montadas, editadas e direcionadas para que a sociedade se inteirasse das sujeiras que deslustram as togas da maioria dos membros do Poder Judiciário do Estado, mostrando que existem delitos de toda sorte, corrupção, improbidade, fraude, alvarás expedidos para chefes de crime organizado e, provavelmente, comércio de despachos, sentenças, liminares, acórdãos, decisões e outros plus transformando o tribunal em verdadeira Feira de Justiça.

De fato, a reportagem preparada deixou mais indignado o mato-grossense e com certeza os operadores do direito, já que a matéria transpareceu mais uma intriga de autoridades do que uma satisfação à sociedade, tendo os desembargadores esfregado suas desavenças deixando uma impressão negativa do que se passa interna corporis da instituição no nosso Estado, revelando à população que nos bastidores desse poder existem tantas mazelas que faltam garis para empurrar o lixo para fora da Corte. A vexata quaestio, agora, está nas mãos da desembargadora Shelma Lombardi de Kato, autoridade que representa uma réstia de luz da nossa gente e que não pode toscanejar e nem deixar de provocar o Ministério Público, que tem o dominus litis da ação penal pública para o caso.

O saudoso magistrado Leopoldino Marques do Amaral, na sua filosófica obra já alertava: "Justiça nós não te conhecemos, nós ignoramos a tua filosofia, nós não sabemos qual é a tua ideologia, nós precisamos saber quais os verdadeiros motivos que te movem, nós queremos conhecer a tua estrutura, os teus mecanismos, nós queremos saber quem são os homens que te comandam, se tem dignidade, se são honestos". Preocupado com a cara da justiça, o laureado juiz continuava a reclamar das impurezas dos homens da justiça dizendo: "Não há cara completa, perfeita, admirável, olhável, se os olhos estão vedados. A personalidade não freqüenta nariz, orelhas e bocas, ela resplandece nos brilhos dos olhos. Vemos a alma pelos olhos. Por eles entramos na alma das pessoas". Por essas razões esse magistrado repetia insultando a justiça gritando "Mostra a tua cara! é um grito de alerta da geração adolescente, o futuro deste país".

Na reportagem do Judiciário que vimos, realmente, nos induz que a justiça quer mostrar a cara, quer dizer à sociedade que nos seus porões, galerias, corredores, gabinetes, plenários, salas e salões existem sujeiras que a geração precisa limpar, mesmo que para isso haja necessidade de sacrificar mais gente, como ocorreu com o juiz Leopoldino Marques do Amaral, que em vida era limpo, puro, culto, exemplo de pessoa e espelho da sociedade, reserva moral do Judiciário, membro da Academia Mato-grossense de Letras, professor emérito das universidades, mas, morto na luta por um ideal de justiça, sujaram-lhe as vestes talares valendo-se da morte, porque morto não fala, não sobe na tribuna, não se defende - é uma vítima do poder. Depois de morto, para esconder as lambanças ocorridas, é fácil dizer que o juiz era ladrão e que ele era o responsável por toda essa rapinagem. Agora, em resposta da luta resfregada do mártir contra a bandalheira que graça no poder, a verdade aparece e ela ocupa os olhos e a mente do povo. Vamos continuar essa luta e fazer a Justiça mostrar não somente a cara, mas, o corpo inteiro. Justiça, retire a venda e os vestuários íntimos. Mostre tudo. A sociedade agradece.

Félix Marques é advogado, presidente da Comissão de Defesa do Instituto Brasileiro de Defesa do Idoso (IBDI/SP) e consultor jurídico do PC do B. E-mail: felixmarques@terra.com.br