DEU EM A GAZETA 24.12.2025 | 06h47

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João Vieira
"Há quatro anos não comemoramos o Natal. Para nós, é um dia como outro qualquer. Não comemos nada de diferente, não há presentes e as crianças não pedem, porque sabem que não temos para dar. Tudo o que tem dentro de casa é juntado do lixo ou recebido por doação". O desabafo é de Maryuri Andreina Arroyo Castillo, de 40 anos, mãe de três filhos e moradora de uma área de ocupação em Cuiabá. Ao lado do marido, José Montarbo, de 31 anos, eles lutam diariamente para garantir o básico para a família: comida, abrigo e dignidade.
Vindos da Venezuela e há quase seis meses em Cuiabá, o casal e os filhos deixaram o país de origem em busca de melhores condições de vida. No entanto, no Brasil, a realidade continua de extrema vulnerabilidade social e econômica.
Na pequena casa de madeira, erguida com material doado na ocupação Vale do Sonho, a família sobrevive com o que José consegue juntar nas ruas. Ele trabalha como servente, quando aparece serviço, e também coleta sucata. A renda média mensal gira em torno de R$ 1.500, somada ao Bolsa Família de R$ 700, valor que precisa atender cinco pessoas. Mesmo assim, muitas vezes falta o essencial.
A casa onde a família vive é feita de madeira, com paredes improvisadas, telhado de eternit e divisórias de PVC separando o quarto e o banheiro. Não há piso, somente chão batido. Há buracos no teto e nas paredes e, quando chove, a água entra por todos os lados. A gente não dorme tranquilo quando começa a chover, relata José.
No dia da visita da reportagem, a casa estava completamente molhada após uma forte chuva. Na geladeira, quase nada. Nos armários, apenas um pacote de arroz e outro de feijão. Os pais não sabiam quando poderiam fazer a próxima compra no supermercado.
Os móveis também têm história. O sofá e a cama onde dormem as crianças foram achados no lixo. O casal dorme em um colchão doado no chão. A mesa é, na verdade, uma maca hospitalar descartada na rua. Fogão e geladeira foram doações e um único ventilador tenta aliviar o calor para todos. Tudo que a gente tem ou é doado ou vem da rua. Quando vejo algo jogado fora, ou eu trago para casa ou vendo, diz José.
Medo da fome
Maryuri conta que tem medo das férias escolares por um motivo simples e cruel: como alimentar os filhos sem a merenda da escola. À tarde faço mingau e cuscuz. Não compramos bolacha, não compramos frutas. A gente compra o que sustenta. As crianças já choraram pedindo outras coisas, mas é isso que temos. Muitas noites, eu e José vamos dormir com fome para garantir que as nossas crianças comam.
A situação se agrava ainda mais por causa da filha mais velha, Maryuri Carolina, de 20 anos. Ela tem deficiência intelectual, é muda, possui Transtorno do Espectro Autista e usa fraldas diariamente, cerca de três por dia. Além disso, precisa de dois medicamentos contínuos, Risperidona 1 mg e Ácido Valpróico de Sódio 50 mg. Os remédios, muitas vezes, não são comprados por falta de dinheiro. A mãe afirma que nunca conseguiu receber a medicação pelo SUS.
Os pais contam que sonham em conseguir uma vaga e transporte para locomoção da filha até a Apae, além de uma consulta com neurologista, vaga que nunca foi liberada. Já as duas filhas mais novas, Yusneiby Zaray, de 10 anos, e Genesis Sinay Montalvo, de 7 anos, vão à escola a pé, em uma unidade próxima da residência.
A própria mãe, Maryuri Andreina, sofre de asma e também espera atendimento com especialista.
Última comemoração
A última vez que a família comemorou o Natal foi há quatro anos, quando ainda estavam em Rio Branco, no Acre, junto a parentes. Desde então, a data passou a ser apenas mais um dia de sobrevivência. Não lembro a última vez que entrei em uma loja para comprar algo. Acho que foi na Venezuela, há muito tempo.
Mesmo na dor, o casal mantém a esperança viva por causa dos filhos. Nossa vida é muito difícil, mas resistimos por eles. Eu dou força para o José e ele me dá força para eu continuar. Às vezes, saio com ele para juntar latinhas, procurar o que o povo joga fora para vender. Meu sonho é entrar numa loja e poder comprar alguma coisa para minha família.
Pedidos de Natal
O maior sonho de Maryuri e José é construir uma casa de tijolos. Já matei cobra aqui dentro. A gente não tem segurança nenhuma. Uma casa de tijolos é sonho de dignidade, afirma José.
Eles pedem doações de material de construção. Além disso, precisam de alimentos, móveis, medicamentos, fraldas tamanho M, brinquedos para as crianças, ajuda para atendimento médico, vaga e transporte à Apae para filha com deficiência, roupas para José (M ou G), Maryuri Andreina (GG), Maryuri Carolina (M), Yusneiby (tamanho 12) e Genesis (tamanho 10).
Para o dia de Natal, o pedido é simples, mas poderoso. Queríamos que as crianças tivessem um dia diferente, com bolo, bolacha, chocolate, suco e outros alimentos que elas não conhecem, mas sonham em experimentar.
Eles contam que as crianças não têm brinquedos. O único é uma pelúcia encontrada no lixo, que a filha mais velha abraça diariamente. Se elas ganhassem bonecas e bicicletas seria muita alegria.
COMO AJUDAR
Pix e informações pelos números (69) 99937-9084 e (69) 99945-0110.
A família mora na área de ocupação Vale do Sonho, na rua N, quadra 1, lote 6.
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