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22.02.2009 | 03h00

500 prostitutas e travestis trabalham 24h no Zero KM

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A baixada cuiabana tem hoje uma das rotas de prostituição mais movimentadas do país, que funciona "full time", ou seja, 24 horas e reúne cerca de 500 prostitutas e travestis em área nobre de Várzea Grande e a poucos quilômetros do centro de Cuiabá. O Zero Km, que conseguiu destaque recentemente na imprensa como palco do escândalo envolvendo o vereador Ralf Leite e um travesti menor de idade, é apontado como a "Babilônia do Sexo". Um comércio a céu aberto, onde além de corpos se vende muita droga. Tudo começou com um posto de venda de combustível, na década de 60. O estabelecimento nasceu com o nome de Zero Km e servia como ponto de apoio de caminhoneiros em viagem. O local era pouco habitado, na região conhecida como "Morro Vermelho". Lama, mato e escuridão e um único bordel, a princípio.

Na década de 70 começou a receber os travestis que tinham os motoristas como clientes e as boléias como redutos. Hoje, 40 anos depois, o mercado do sexo mudou e inflacionou no Zero Km. Um programa varia entre R$ 50 e R$ 100, acrescido do preço do motel (na casa dos R$ 40). Os rudes caminhoneiros foram substituídos, em sua maioria, por homens que se apresentam socialmente como heterossexuais e que só lá, com parceiros do Zero Km assumem a homossexualidade reprimida. Pertencem as classes média e alta. Basta acompanhar o movimento de veículos na região para saber quem hoje fomenta e mantém a prostituição no Zero Km.

Foi o que a reportagem de A Gazeta fez, esta semana, ao se misturar entre frequentadores. Na noite de quinta-feira, sem chuva, grupos de até seis travestis desnudos se aglomeravam nos pontos nobres da avenida do sexo. Entre 21h e 22h30 vimos de tudo. Policiais em abordagens a veículos que passavam pelo local, até manifestações de afetividade de um PM mandando beijos para travestis. Neste período, três viaturas diferentes passaram pelo local, em rondas, sem que isso afetasse a rotina de quem se prostituía. Movimento intenso de veículos novos e de luxo, liderados pelas caminhonetes importadas, era acompanhado passo-a-passo por quem buscava um cliente ou mais, na jornada que apenas começava. Debruçado sobre o motorista o travesti siliconado e quase nu fala que o programa custa R$ 50. Mas uma breve pechinchada já reduz o valor para R$ 30. "O que vem no pacote de prazer?", pergunta o freguês. "Faço barba e bigode e não paro enquanto não tiver satisfeito", garante ele. Para os leigos, é bom explicar, que isto significa que o cliente terá direito a usufruir de uma relação ativa e passiva com o parceiro.

Como a rotatividade é muito grande, aqueles que vendem ali o corpo sabem que precisam seguir as regras preestabelecidas para a sobrevivência. A primeira é que não existe profissional liberal neste ramo. Não no Zero Km. Cada metro quadrado, desde os mais nobres, na avenida dos motéis, até os pontos mais periféricos nas vielas escuras e sem asfalto, estão todos loteados. Cafetinas e rufiões ditam as regras. Não há quem tente penetrar neste espaço sem ficar impune. Hoje a violência entre frequentadores foi reduzida, perto do que ocorria no passado, admite Cláudia Cristina Carvalho, coordenadora do Centro de Referência em Direitos Humanos de Combate ao Racismo e a Homofobia. Hoje o centro, que começou a ser implantado em 2005, é o único do estado a receber denúncias contra o homofobismo e a defender os direitos, principalmente dos travestis. Uma das primeiras ações foi justamente buscar que os grupos se organizassem, para reduzir os conflitos e as agressões físicas que eram comuns e rotineiras.

Mesmo com estrutura pequena, o Centro acaba sendo um dos únicos canais que ouve e socorre os travestis que se prostituem nas ruas e que são as principais vítimas da transfobia, que é a aversão ou discriminação contra pessoas trans (transexuais, transgêneros ou travestis). A agressão não é só física, lembra Cláudia, mas passa pela falta de apoio de muitas instituições, inclusive públicas, que não recebem pacientes pertencentes a estas classes. Cita o caso de um travesti com problema grave de dependência química por drogas que só depois de um grande esforço conseguiu ser aceito em uma unidade de saúde de Cuiabá.

As áreas do Zero Km têm uma delimitação invisível, mas que nunca é desrespeitada. O perímetro de exploração por prostitutas e travestis são distintos. Elas ocupam calçadas de bares e boates. Nas noites, as esquinas são dos travestis. As áreas mais nobres são ocupadas por aqueles que supostamente estão no auge da carreira e, é claro, que trabalham para o cafetão que tem o direito a explorar o espaço. A parte mais periférica do Zero Km fica para os travestis menores de idade e os menos prestigiados. São nestes pontos onde a venda de drogas é mais intensa.

São justamente os jovens adolescentes, entre 13 e 17 anos, que engrossam as calçadas da prostituição, não só no Zero Km mais na região metropolitana, é que tem preocupado o Centro, garante Cláudia. Segundo ele, existem relatos de várias "casas", mantidas pelas cafetinas, onde jovens arregimentados no interior, em sua maioria, são abrigados. Em Várzea Grande existem duas. O preço da proteção é caro. As diárias, dependendo das instalações e do ponto cedido para o travesti atuar pode variar de R$ 30 a R$ 60.

Mas não se resume ao pagamento pela comida, cama e espaço na calçada. O profissional do sexo muitas vezes precisa traficar, não só para obter sua droga como para oferecê-la ao cliente. Se desagradar um deles e for denunciado é punido severamente com agressões físicas. Depois expulso da casa. Apesar de degradantes, e sem o menor "glamour", raramente estas situações denunciadas nos corredores de um pronto-socorro, são formalizadas. No caso dos adolescentes, a discriminação e o abandono da família antes que tenham uma situação estável, faz com que não consigam sobreviver longe dos "carrascos". Segundo Cláudia, a preocupação com estes meninos travestidos, que na maioria das vezes não tem a maturidade de gênero sexual que seguirão, é cada vez maior. Tanto que um dos trabalhos que vem sendo desenvolvido é de fazer o mapeamento da situação, inicialmente na região metropolitana, já que o risco e vulnerabilidade a que estão expostos é muito grande.

De cada 10 programas, nove são feitos com homens casados, segundo dados da Associação Nacional dos Travestis. A vice-presidente da entidade esteve em Cuiabá, participando de um curso voltado para policiais, com a participação do Núcleo de Estudo de Violência e de Cidadania (NIEVCi), da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Roberta Venuqui, que é de João Pessoa (PB), confirma um dado que é o mesmo, praticamente em qualquer lugar do país, onde existe este tipo de prostituição, explica a coordenadora do Nievci, Vera Bertolini.

Na opinião dela, o recente fato envolvendo o vereador e a prostituição no Zero Km mostra a necessidade urgente das autoridades voltarem a atenção para o que vem ocorrendo. O fato de a prostituição estar sendo fomentada por membros da elite por si só torna mais difícil a punição no caso dos crimes diários que se praticam ali, a vista de todos.

Vera lembra que o Zero Km nada mais é do que uma grande rede de prostituição, que sustenta, além da rede hoteleira, frotas de táxis e moto-táxis que transportam travestis e prostitutas. Beneficiam donos do comércio de bebidas, traficantes e policiais corruptos que achacam quem vende o corpo ou aqueles que os "protegem". Os únicos que perdem sempre são os que se prostituem, homens ou mulheres. Acredita que está mais do que na hora da sociedade parar de ignorar a prostituição no Zero Km, consciente que quem a mantém pode estar muito próximo.

Vera lembra que se o custo do programa é considerado "caro", porque embutido na relação sexual está o sigilo da fonte de quem paga para tê-lo. Mas avalia que o problema é de uma complexidade muito maior, onde talvez só a psicanálise possa explicar o porque um homem busca em uma relação sexual saciar o desejo de ser "penetrado" por uma mulher.

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