04.01.2024 | 09h36
Histórias cruzadas é um dos maiores best sellers sobre discriminação social, da escritora norte- americana Kathryn Stockett, que em suma, relata o tratamento diferenciado em situações idênticas, e a supressão de direitos civis fundamentais de pessoas socialmente desprivilegiadas.
Tal conto, relata muito bem o que vem ocorrendo na revisão da vida toda, com os aposentados, idosos, hipossuficientes, quais tiveram suas contribuições previdenciárias anteriores a 1994 confiscadas.
O tratamento antijurídico discriminatório e diferenciado que aqui trazemos, se dá primeiramente pelo fato de que o STF sequer deveria estar tratando tal demanda, visto que, como bem fixado nos votos do julgamento de mérito do próprio STF pelos Ministros, acerca do tema, a favor dos aposentados, se trata de análise teleológica de legislação infraconstitucional, o que é vedado ao STF analisar, pois não se amolda a nenhum dos casos de competência do STF para julgamento, conforme previsto no artigo 102, da Constituição, com procedimento regulamentado no artigo 1.035 do Código de Processo Civil (CPC).
O STF violou sua própria Súmula 636 para atender aos pedidos do devedor, qual dispõe:
Não cabe recurso extraordinário por contrariedade ao princípio constitucional da legalidade, quando a sua verificação pressuponha rever a interpretação dada a normas infraconstitucionais pela decisão recorrida.
Ultrapassado o recebimento ilegal do RE, decisão irrecorrível, eivada de incompetência absoluta, o mérito de tal processo foi julgado duas vezes, em plenário físico e virtual, sendo em ambas as ocasiões, vitoriosos os aposentados.
Ultrapassado o mérito, agora o Privilegiado devedor (Governo), qual tem relação íntima com o Julgador (STF), tenta induzir aquele órgão, a violar a lei e seus precedentes, criando uma situação ilegal especial para o processo em questão.
Para explicar a situação especial e antijurídica que o devedor vem impondo por meios obscuros e ilegais sua aplicação pelo STF, devemos trazer a velha pirâmide de Kelsen.
Conforme tal pirâmide, na análise do direito, a primeira lei suprema a ser respeitada, é a Constituição Federal.
O artigo 230 da CF/88, refere que a família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, protegendo sua dignidade e o seu bem-estar.
A Constituição Federal, em seu art. 93, IX, prevê que todas as decisões devem ser devidamente fundamentadas.
O Art. 103 da LEI Nº 8.213, DE 24 DE JULHO DE 1991 é claro em seu parágrafo único ao prever que” Parágrafo único.
Prescreve em cinco anos, a contar da data em que deveriam ter sido pagas, toda e qualquer ação para haver prestações vencidas ou quaisquer restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social, salvo o direito dos menores, incapazes e ausentes, na forma do Código Civil.
Segundo o artigo 926 do CPC, “ 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente”.
O recente Tema nº 774 do STF é claro quanto a impossibilidade do Tribunal mitigar o pagamento de atrasados em caso de revisão previdenciária:
“Assinalo ser defeso a este colegiado adentrar a discussão relativa à determinação, no caso concreto, do marco temporal a ser adotado para o pagamento de passivos. Isso porque isso demandaria a análise da prescrição, o que não se poderia fazer sem se esbarrar no exame da legislação infraconstitucional ou no revolvimento dos fatos e das provas dos autos, os quais são vedados nesta hipótese.”
Nessa toada, o devedor força o Tribunal, a violar seus precedentes, violar a lei, e aplicar marco temporal para pagamento dos atrasados referentes a revisão da vida toda, tendo convencido alguns Ministros, que, sem qualquer explicação jurídica de como ultrapassaram as barreiras legislativas e jurisprudenciais acima delineadas, usando a pirâmide de Kelsen de ponta cabeça, querem que os efeitos financeiros contem somente a partir da publicação do acórdão, aumentando o já exacerbado e trilhonário enriquecimento ilícito do devedor, que está deixando de pagar todos os benefícios decaídos entre 1999 e 2009 ( limite decadêncial de 2019, data do precedente firmado pelo STJ, onde existiam ínfimas ações sobre o tema no país) e todos os benefícios concedidos posteriores a Emenda 103/2019, que chancelou o confisco das contribuições anteriores a 1994.
O Relator do processo, Ministro Alexandre de Moraes, constitucionalista excepcional, jurista renomado, se atentou em seu voto nos embargos de declaração, à limitação do que pode ou não ser mitigado pelo STF de acordo com a Lei.
O voto do Ministro Alexandre de Moraes, relator dos embargos de declaração, foi claro em pontuar que não iria modular a questão de prescrição e decadência, por serem questões infraconstitucionais que não estão em análise ou discussão na demanda, sendo impossível mitigar a efetividade e efeitos de tal lei:
Voto:
Assegurado esse direito aos segurados pelo julgamento do recurso paradigma, por óbvio, o prazo para a revisão do benefício seguem as regras de prescrição e decadência previstas na legislação de regência.
Portanto, caberá às instâncias de origem analisar, no caso concreto, a ocorrência da prescrição ou da decadência à luz da legislação infraconstitucional pertinente e do precedente do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
Rememorando o início do artigo, acerca do conto Histórias Cruzadas, recentemente o Tribunal, julgou a tese do século, tese tributária que beneficia empresários bem sucedidos, afortunados, (Tema 69), onde restou fixada a tese de que “o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins”.
Segundo recente entrevista do Ministro Fernando Hadad, tal julgamento da direito à empresas a receberem de volta da união, mais de 500 bilhões de reais, como vastamente divulgado na mídia
(https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2023/12/haddad-anuncia-nesta-quinta-novas-medidas-para-aumentar-arrecadacao.shtml) - Segundo Haddad, cerca de cerca de R$ 500 bilhões foram devolvidos para empresas com base em decisões do Supremo Tribunal Federal (STF). “A empresa continuará podendo compensar, mas estará limitada a determinado porcentual. Tem empresas há anos sem pagar impostos”, criticou.
Em tal ação, a União buscava, por meio dos embargos de declaração, em síntese, a modulação dos efeitos da decisão favorável ao contribuinte, para que este entendimento só tivesse eficácia prospectiva, a partir da data do julgamento dos embargos declaratórios, bem como que o ICMS a ser excluído da base de cálculo das contribuições em voga fosse o efetivamente pago e não aquele destacado na nota fiscal de saída.
Houve o acolhimento parcial do recurso da União pela Suprema Corte, com a aplicação do instituto da modulação dos efeitos da decisão, nos seguintes termos: “O Tribunal, por maioria, acolheu, em parte, os embargos de declaração, para modular os efeitos do julgado cuja produção haverá de se dar após 15.3.2017 - data em que julgado o RE nº 574.706 e fixada a tese com repercussão geral "O ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS" -, ressalvadas as ações judiciais e administrativas protocoladas até a data da sessão em que proferido o julgamento, vencidos os Ministros Edson Fachin, Rosa Weber e Marco Aurélio”.[1]
Assim, os contribuintes que ajuizaram ações questionando a cobrança tida por inconstitucional pelo STF até 15/03/2017 (data do julgamento do RE 574.706) terão o direito de realizar a restituição dos valores pagos à maior nos últimos 5 anos, contados da data do ajuizamento da ação.
Ora, o STF precisa explicar para a sociedade, o porquê pagou aos milionários todos os retroativos devidos, referente as ações protocoladas até a decisão do RE, e para os hipossuficientes idosos, pobres, alguns ministros sem qualquer fundamentação legal, não querem pagar qualquer retroativo anterior ao julgamento do RE, sendo uma situação extremamente idêntica, com tratamento totalmente discriminatório e diferenciado.
E ademais, a única situação que diferencia os dois casos acima trazidos, é que sequer há possibilidade de modulação na revisão da vida toda, já que no Tema 69, foi declarada inconstitucionalidade de norma, abrindo a possibilidade jurídica por consequência da lei 9.868/99, cujo artigo 27 assim dispõe:
Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado."
Já na revisão da vida toda, se trata de análise de legislação infraconstitucional, sem qualquer previsão de possibilidade de modulação em legislação e com legislação vigente sobre pagamento de atrasados, ou seja, está sendo aplicado dois pesos e duas medidas na Corte Suprema do país por simples questões de vulnerabilidade social e hipossuficiência da parte? Essa pergunta será respondida no Plenário do STF no dia 01/02/2024.
Diogo Alves é advogado
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Edison Settin - 05/01/2024
PARABÉNS Dr. DIOGO. Este texto deveria ser lido nos veículos de audiência. O povo precisa saber quem são os altos mandarmos dessa nação . Muito técnico e socialmente legítimo o sua abordagem.
Antonio Carlos Silvestre - 05/01/2024
Enfim, Charles Degaule tinha razão, quando disse: " O Brasil não é um país sério"
Luiz R O - 05/01/2024
Ótimas informações em texto muito didático e objetivo. Retrata a realidade atual que viola o inviolável. Coisa julgada passou a ser relativa violando assim princípios basilares do direito.
Arlindo Brito - 04/01/2024
Boa noite,esse STF está fazendo com que a lei do confisco em cima do contribuinte seja aceita pelo apelo de um sistema corrupto e ladrão como o INSS, eu me recuso a deixar isso acontecer com meu suor, isso é muito inadimissivel, a classe trabalhadora não pode suportar tamanha escravização desse sistema.
Heitor Bento Alves - 04/01/2024
Artigo de excepcional transferência e clareza jurídica. Parabéns.
5 comentários