Publicidade

Cuiabá, Segunda-feira 24/11/2025

Cinema - A | + A

02.08.2015 | 00h00

Sinhá Moça

Facebook Print google plus

É oportuno observar o quanto o liberalismo caracterizou-se como uma expressão simbólica nas relações étnico-raciais, no escravismo; considerando-se que o abolicionismo significou, sobretudo a emergência da infanto dinâmica urbana versus o geronto movimento rural. Notar-se-á uma inversão de valores, cujo problema do peso anacrônico da escravidão era imputado aos negros, que não elegeram-na, tentando eximir assim os brancos deste atraso, que se constitui em mal sem precedente histórico. Comportamento muito bem observado no cinema, sobretudo no filme Sinhá Moça (1953), de Tom Payne e Oswaldo Sampaio.
Projeto cinematográfico que me faz lembrar que o Brasil foi o último pais abolir o estatuto escravagista; fê-lo em um cenário totalmente estranho a escravidão clássica, conhecida por todas culturas e civilizações. Nô-la, o escravo tinha salvaguardado a sua dignidade, na medida em que uma escrava ficava grávida de um filho com o senhor, o rebento nascia livre e a mãe se tornava liberta.
Por exemplo, na mitologia grega a mais remota expressão da sistematização do pensamento ocidental, o Apolo, símbolo da beleza e da harmonia foi escravizado por duas vezes, rebelando-se contra o Grande Zeus, que em represália o fez cativo. Nota-se que contudo, o Apolo é reintegrado sem perder o status apolíneo de beleza e harmonia.
Somando-se ainda ai o fato do cativo ser reintegrado na sociedade que o escravizou. É sabido, entretanto que no período colonial a lacuna jurídica era subsidiada pelo Direito Romano, implicado nesta instituição escravista, adotando-o, o Brasil fez, na época, vistas grossas às ordenações, aí, então, pertinentes aos direitos dos escravos. Considera-se com efeito que, o escravismo brasileiro foi atípico, onde o pai escravizava o próprio filho. Que me perdoe o meu mestre Sergio Buarque de Holanda, mas aqui considerar escravocrata cidadão cordial, é demasiadamente indigesto para engolir.
Os diretores fazem uma pintura daguerrioptica, que permite considerar que, as relações sociais do ponto de vista da opressão é tão complexa, a ponto de não existir elite como alguns intelectuais mais precipitados o dizem. Elite implica uma questão indentitária, se os grupos privilegiados impregnados do eurocentrismo não se identificam com a maioria, também não a representam, justificando tamanha insensibilidade dos segmentos privilegiados com a patuleia.
A história do Brasil tem sido simplesmente uma onda de assaltos, caracterizados na imagética de ricos euro-hetero-macho-autoritários, que são poderosos invadindo qualquer possibilidade de paz dos empobrecidos em condição de miséria, que tem pago o pato. Permitindo-me dizer que aqui não há elites e sim violentas classes dominantes; vivendo fantástico sonho do anacrônico do luxo, estranho ao cotidiano europeu, com o sangue do miseráveis, que são sempre alheios ao bem socialmente válido, com o melhor da natureza e dos bens públicos, que são evadidos na pilhagens de notáveis egoísmos dos tais “homens de bem” de colarinho branco.
Combate-se,desta maneira, cinicamente os desvios de condutas dos escuros descamisados as verdadeiras vítimas da anomia, salvaguardando os claros privilegiados, valendo-se deste mal que é uma das origens da violência. Segmentos que vivem no fausto da apartheid sócio racial, que faz nas mais cruéis e sangrentas higienizações, dos bairros ricos e boêmios; frequentado em meio ao “charme” silencioso de parte intelectualidade leniente com esta de humilhação e destrato, imposto a maioria de imagem ibero-afro-ameríndia.
No tratamento de ambiência de época o filme em questão fez-me pensar que existe um imaginário da naturalidade da opressão da africanidade. Nota-se que recentemente o famoso Dunga, técnico da seleção brasileira, em uma entrevista acostumado a apanhar. Frente ao repugnante exemplo de injuria, não aconteceu nada. Constata-se aí infelizmente uma provável pedagogia do racismo de caráter eurocêntrico e intransigente, nos meios de comunicação de massa. Os poderosos cínicos, alimentados nos absurdos midiáticos fazem, contudo, as costumeiras vistas grossas à estratégia de desumanização do diferente, pelo euro-hetero-macho-autoritário, em plenos meios de comunicação que são concessão pública, que há muito tempo vem recebendo fábulas, em campanhas públicas mono culturais. Desconhecendo, com efeito à diversidade no país poliétnico de economia dependente; fazendo-o, ainda mais viciado no patológico colonialismo cultural.
Abordagem reflexiva que se percebe no antológico filme Sinhá Moça (1953), de Tom Payne e Oswaldo Sampaio, que é um melodrama sugerindo caminhos para várias possibilidades críticas, das relações étnico-raciais do negro. Revelando, por seu turno o comportamento liberal da emergente burguesia paulista, que fez do cinema, sobretudo na paulistíssima Cia Vera Cruz, onde a produção cinematográfica constituiu um espaço de luta do sentimento urbano contra a convalescente aristocracia agrária.
Sinhá Moça mostra toda a tentativa de impor sobre os negros o peso do atraso da escravidão atípica, sem precedente histórico na qual o pai escravizava o próprio filho. Por incrível que parece o senhor de escravo foi tratado com bom, atribuindo-se a vilania ao mulato capataz e também para o delegado caudatário do escravismo; considerando a violência que ambos tratavam os cativos.
Perceber-se-á, nô-la, importante inventário da origem da persistente o vício aristotélico das classes dominantes esconderem-se nas sombras das mãos sujas. Como se vê, ainda na atualidade, sobretudo nas inexplicáveis ações anônimas das milícias e higienizações sócio raciais, assassinas.
Na película Sinhá Moça, a capacidade de rebeldia e organização contra o sistema era exógena a dinâmica de resistência do escravo. Atributo dado à mocinha do filme, uma espécie de signo da liberdade, supostamente branca no progresso positivista em detrimento do atraso preto da escravidão rural; contrariando o sonho da indústria urbana.
O sociólogo Gilberto Freire influenciou a intelectualidade dos anos cinquenta; tendo em vista que sua obra Casa Grande e Senzala é no mínimo um equívoco tentando harmonizar a relação entre senhor e escravo. Como se o último aceitasse tranquilamente esta condição. Observo, “ao meu quase cego ver”, que o doutor Gilberto Freire foi insensível, na sua época, até mesmo com hermenêutica hegeliana, que já apontava profundo o conflito subjetivo, no processo de escravidão com base servil. Parece-me incrivelmente que quem desconsidera africanidade, por inversão de valor, tem sido compensado.
Comenta-se, movimento negro, que o humorista Tiririca teve mais espaço, tornando-se famoso nos meios de comunicação, quando depreciou veementemente com pilherias, a imagem da mulher negra, “ao meu quase cego ver”, a mais expressiva em níveis de discriminação, que por força da dialética faz do limão a limonada, sendo uma página fundamental da pedagogia brasileira.
A película Sinhá Moça foi um sucesso internacional ganhando as principais premiações do cinema, inclusive uma indicação ao Oscar, de melhor atriz coadjuvante no talento de ébano da gloriosa atriz Rute de Souza.
Comento, portanto, este memorável filme em homenagem a data de 25 de julho, na medida em que se comemora por força da Lei 12987, o Dia Nacional da Teresa de Benguela e da Mulher Negra. Esta heroína nacional da africanidade liderou com o esmero o Quilombo do Quariterê, usando o sistema parlamentarista em pleno século XVIII, ainda imperial, no cenário histórico da Vila Bela da Trindade da Santíssima Trindade, primeira capital de Mato Grosso, próximo a Bolívia. Como cinema é debate vale a pena conferir.

Colaboração de Rafael Martine, Keila Oliveira, Mory Marcia Lobo e Lindalva de Souza.
 

Voltar Imprimir

Publicidade

Comentários

Enquete

O que você acha da prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro?

Parcial

Publicidade

Edição digital

Segunda-feira, 24/11/2025

imagem
imagem
imagem
imagem
imagem
imagem
btn-4

Indicadores

Milho Disponível R$ 66,90 0,75%

Algodão R$ 164,95 1,41%

Boi à vista R$ 285,25 0,14%

Soja Disponível R$ 153,20 1,06%

Publicidade

Classi fácil
btn-loja-virtual

Publicidade

Mais lidas

O Grupo Gazeta reúne veículos de comunicação em Mato Grosso. Foi fundado em 1990 com o lançamento de A Gazeta, jornal de maior circulação e influência no Estado. Integram o Grupo as emissoras Gazeta FM, FM Alta Floresta, FM Barra do Garças, FM Poxoréu, Cultura FM, Vila Real FM, TV Vila Real 10.1, TV Pantanal 22.1, o Instituto de Pesquisa Gazeta Dados e o Portal Gazeta Digital.

Copyright© 2022 - Gazeta Digital - Todos os direitos reservados Logo Trinix Internet

É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem a devida citação da fonte.