Mato Grosso também tem queijo

A produção artesanal de queijos é uma atividade que, via de regra, envolve toda a família e é cercada de muita paixão. Só amor mesmo para explicar o que leva as pessoas a acordarem ainda ao alvorecer, ordenhar as vacas, manejar o leite e iniciar o processo de fabricação que pode levar horas, dias, meses e até anos até que o produto fique pronto para o consumo.

Conheço um pouco desse universo por ter visto muitos pequenos produtores rurais da Zona da Mata mineira -região onde nasci -, trilhando esse mesmo caminho.

Essa minha percepção infantojuvenil se confirma agora na vida adulta e profissional. Como jornalista, acompanhei durante alguns anos a implantação e o desenrolar do projeto Balde Cheio - tecnologia da Embrapa aqui implantada pelo Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Estado de Mato Grosso (Sebrae MT) em inúmeras pequenas propriedades rurais, muitas delas hoje se destacando no mercado de produtos lácteos.

Prova disso é a segunda edição Concurso do Queijo de MT, realizado nos dias 24 e 25/10, dentro do Festival do Queijo, no Centro de Eventos do Pantanal, premiando 88 produtos locais, sendo que 39 receberam Ouro. O evento organizado pelo Sebrae/MT reconhece a excelência e a diversidade da produção artesanal de produtos lácteos.

Para a diretora -superintendente do Sebrae/MT, Lélia Brun, o concurso é uma vitrine para o talento e a dedicação dos produtores locais. Cada queijo premiado representa uma história de trabalho e de valorização do que é nosso.

Em muitos casos, histórias de superação inimagináveis. Caso de Isaías Nunes de Freitas, do laticínio Brasifort, de Nova Brasilândia (a 201 km de Cuiabá), ganhador de três medalhas. Ao subir ao palco da premiação, ele contou ter sido perseguido, chegou a ser preso durante uma inspeção, sem que nenhuma irregularidade fosse constatada na propriedade. Mesmo assim não desistiu e seguiu em frente. "Diante do que passei, é uma honra estar aqui", disse emocionado.

Emoção também provocou a produtora Ana Lúcia Almeida Pereira, que conquistou duas medalhas - bronze no doce de leite pastoso e ouro no de barra. Sobre a receita de sucesso, resume: a gente trabalha com amor. Ao subir ao palco levou consigo toda a família -o marido Celso do Carmo Pereira, com quem é casada há 29 anos, os filhos Carlos Eduardo, de 27, Antônio Carlos, de 15, e os gêmeos Agusto Cesar e Cesar Augusto, de 13, todos envolvidos na produção de doces e queijos. "Esse serviço, se não tiver família, não faz", constata, acrescentando que a atividade não tem sábado, domingo ou feriado e que exige muitos cuidados em todas as etapas.

Cuidados que também estão presentes na Quinta da Cartucheira, dos produtores Silas Vicente e Larissa Berti, ganhadores de seis premiações no concurso. "Queijo requer cuidado como uma criança, é preciso ter um olhar maternal para o produto", analisa Larissa, mãe de dois filhos, uma delas acompanhava os pais no evento.

Eles conquistaram quatro medalhas de ouro - com a Manteiga Trufada e os queijos Ouro da Cartucheira, Esmeralda e o Diamante - além de prata com o Rubi, levando ainda o de Melhor Queijo de MT, na Categoria Super Ouro, com o queijo Ouro da Cartucheira.

Larissa reforça que, cada vez mais, Mato Grosso tem se tornado conhecido como produtor de queijo de qualidade no Estado, no Brasil e até internacionalmente.

Ao longo de 2025, eles ganharam uma medalha de ouro e quatro de prata no Prêmio Queijo Brasil, em Blumenau; e em setembro, conquistaram a medalha de bronze no Mondial du Fromage et des Produits Laitiers, em Tours, na França, onde a Queijaria da Nildes, de Paranatinga, ganhou prata com o queijo Nozinho Temperado. Orgulhosa da premiação, Larissa Berti conta que a nota de corte desse concurso foi muito alta -85 para bronze, 90 para a prata e 95 para o ouro.

Em novembro, os queijo Esmeralda (de mofo azul) e Diamante (de mofo branco) concorrem no World Cheese Awards, em Berna, na Suíça. "Trata-se do maior concurso do gênero do mundo. Vamos ser avaliados por um juri internacional no berço do queijo, que é a Europa", avalia Larissa, feliz por terem sido selecionados para a competição.

O concurso teve 311 produtos inscritos, de 96 empreendimentos de 38 municípios de todas as regiões do estado. O alto número de inscrições demonstra o crescimento do setor e o interesse dos produtores em aprimorar técnicas e alcançar novos mercados, destaca Valéria Pires, Gestora Estadual do Agro no Sebrae-MT.

Na categoria Inovação Regional - Raquel Cattani - foram premiadas com ouro a queijaria J3, com o queijo Cuiabrie; e sem certificado, a queijaria Sítio do Queijo com o Recheado com Pequi.

Receberam uma medalha de ouro as queijarias Águas Claras, Recanto dos Búfalos, Doces Campo Alegre, Sítio Nossa Senhora das Graças, Queijaria Frigieri, Cooperativa de Juscimeira, Queijaria Vale da Chapada, Estância Cupertino, Akaiá, Doces Dona Ana, Sítio Duas Irmãs, Sítio Arruda, Pé de Queijo, Sítio Monte Carmelo e o Sítio do Queijo.